Avançar para o conteúdo principal

Palavras soltas (13/06/2014 - Janelas/Window)



As palavras soltas de hoje estão sonolentas. Tal como o poeta um dia disse: "...tenho em mim todos os sonhos do mundo." A janela do meu quarto é uma porta aberta para esses meus sonhos. Dela consigo ver o que mais ninguém vê. E nela mais ninguém me vê. É só mais uma dos milhões de janelas dispersas por todo o mundo. Algumas com portadas, outras com cortinas, outras com estores, outras, ainda, sem vidros, ... E algumas existem sem portadas, cortinas, estores, vidros, ..., e sem paredes. Mesmo que alguém no mundo soubesse da existência da minha janela, da minha existência, o que saberia da minha janela e de mim essa pessoa? Também passam por ela algumas pessoas por dia e nenhuma delas sabe muito mais sobre a minha janela ou sobre mim. A minha janela, tal como as vossas, encontra-se inacessível a pensamentos alheios. Não será um pensamento qualquer que consegue chegar até ela. E quando digo chegar não me refiro ao ato de tocar na minha janela com a mão. Refiro-me, sim, ao ato de tocar-lhe com a alma, com os pensamentos. Mas isso já seria demasiado para uma alma qualquer, ... para um pensamento qualquer. E o destino continua a puxar-nos a todo o vapor sentado na sua locomotiva. E que bem sentado que ele vai. Sem se preocupar com os passageiros que conduz e, muito menos, para onde os leva. De cada vez que a verdade cai na minha mente sinto-me vencida. Parece que o estado de lucidez é o pior estado que alguém pode ter. Ou será que é o contrário? Será que é muito melhor estar lúcido em vez de andar como que embriagado? É neste estado que se perde qualquer tipo de ligação que se possa ter com a vida. Qual estado? No estado que ainda não decifrei se será o de lucidez ou o de embriaguez ou, então, se será nos dois. A despedida torna-se difícil quando nos sentimos assim. Eu adoro a minha janela. Mas, ao mesmo tempo, no meu estado de lucidez, sei que não passa de uma janela para a qual, talvez, eu não tenha capacidade suficiente de dar o salto. Ouço o sinal de partida do comboio no meu pensamento. A estação está vazia. Talvez hoje só eu esteja num estado de lucidez. Talvez hoje eu seja a única pessoa a alucinar. Talvez hoje eu seja a única pessoa nesta estação. E sou. O comboio não espera muito mais por mim. O meu cérebro teima em fazer nascer nos campos verdejantes da mente flores interregotivas. Questões e mais questões... Talvez por um tipo de disseminação endozoocoria, zoocoria, anemocoria, hidrocoria, autocoria, ou por uma outra qualquer ainda por inventar. E é assim que fico dividida. De um lado tenho o comboio do destino, do outro a minha janela, em cima a minha mente, e em baixo os meus pés, com os quais tenho que me mover. Afasto-me da janela e sento-me na minha cama. Sento-me para pensar melhor. Ter os lados todos juntos pode não dar muito bom resultado. E como o lado mais fácil de me afastar é a janela, afasto-me dela para que possa pensar melhor. Eu não sei o que o futuro me reserva. Serei o que penso ser? Será que o que penso ser é o que sou? Mas eu penso tanta coisa ao mesmo tempo! Como hei-de separar as ideias na minha mente? Talvez devesse existir semáforos para os pensamentos. Agora está verde sais tu. Talvez fosse mais fácil controlá-los e arrumá-los nas garagens respetivas. Acho que nos manicómios existem doidos com mais certezas do que eu neste preciso momento. A ausência de certezas remete-me para uma outra questão. Serei certa ou menos certa? Em quantas janelas ou mansardas no mundo não estarão agora milhares de pessoas debruçadas a sonhar? Será que estão lúcidos? Será que estão embriagados pela realidade que pensam ser real? Talvez eles sejam corajosos o suficiente para saltarem de todas as mansardas espalhadas pelo mundo! E, talvez, eles consigam, assim, conquistar o mundo! O mundo foi feito para ser conquistado. Se assim não fosse não teria sido, nunca, inventado! Mas só que nasce para o conquistar é que tem direito a ele. Os outros... Os outros apenas sonham em conquistá-lo. E ficam escondidos atrás das suas janelas. E eu? Eu tenho sonhado. Tenho grandes sonhos. Alguns são tão grandes que a minha mente não consegue visualizá-los por completo. E tenho que os ir visualizando aos poucos. Ora o canto direito superior, ora o canto esquerdo inferior, ... vou visualizando-os aos poucos. Talvez a minha janela seja das que não têm parede. Talvez seja esse o motivo de ninguém a ver e de, principalmente, eu não a ver. Eu acho que todos somos conquistadores do mundo enquanto estamos a dormir. Depois de acordar... bem, depois de acordar, para alguns mantém-se a conquista enquanto que para outros começa a vida real, a opacidade da vida real. O mundo torna-se um desconhecido a cada acordar. Abrimos a janela e nada do que vemos nos é familiar. Saímos de casa e já nem sabemos o nome da rua pela qual caminhamos. Mas isso já são outras palavras soltas. Ana Reis




Today my words are sleepy. Like the poet once said: "... I have in me all the dreams of the world." The window of my room is an open door for those dreams. It can see what nobody else sees. And no one sees me in it. It's just another in millions of windows around the world. Some with doors, some with curtains, others without glasses, ... And some haven't shutters, curtains, glasses, ... and walls. Even if someone in the world knew that my window exists, that I exist, what would they know about my window and about me? Some people pass by my window everyday and none of them know much more about my window or me. My window, just like yours, is inaccessible to others thoughts. Any thought can reach it. And when I say reach I am not referring to the act of touching the window with the hand. I mean, yes, the act of touching my window with the soul, thoughts. But it would be already too much for some souls ... for some thoughts. And fate keeps pulling us while it is sitting in its locomotive. And how well sit it is. Without worrying about passengers and about the final destination. Each time that the truth falls in my mind I feel unsuccessful. It seems that the state of lucidity is the worst state that anyone can have. Or is it the opposite? Is it much better to be lucid instead of walking as if I was drunk? It's in this state that I lose any connection that I may have with life. In what state? In the state that isn't yet deciphered if it is lucidity or drunk, or it will be in both states? The dismissal becomes difficult when we feellike this. I love my window. But at the same time, in my state of lucidity, I know it is just a window to which, perhaps, I don't have enough capacity to take the leap. I hear the starting signal from the train on my mind. The station is empty. Maybe today I'm just in a state of lucidity. Maybe today I am the only person to hallucinate. Maybe today I am the only person at this station. And I am. The train doesn't expect much more for me. My brain insists on bloom interrogatives flowers in the green fields of my mind. Questions and more questions ... Maybe it's some kind of endozoochory, zoochory, anemochory, hydrochory, autocory dissemination, or it's some other that hasn't be invented yet. And that's why I'm confused. On one hand I have the train's of destiny, on the other my window, on the top I have my mind, and beneath me I have my feet, with which I have to move. I walk away from the window and sit on my bed. I sit down to think better. It's complicated to have both sides together. And because it's more easy to get away from the window then from the others I just get away from it so I can think better. I don't know what the future holds to me. Will I be what I think I am going to be? But I think so much thoughts at once! How shall I separate the ideas in my mind? Maybe it would be better if exists lights for thoughts. Now it's green for you, you can come. Maybe it would be easier to control them and to lock them in their respective garages. I think that at the asylums exists insane people with more certainty than me right now. The lack of certainty brings me to another question. Will I be right or less right? At how many windows or dormers in the world won't be right now thousands of people hunched dreaming? Are they lucid? Are they intoxicated by the reality that you think is real? Maybe they are brave enough to jump from all lofts around the world! And, maybe, they conquer the world! The world was made to be conquered. Otherwise it would never be invented! But only who born to conquer is entitled to do it. Others ... The others just dream of conquering the world. And they are hidden behind their windows. And I? I dream. I have big dreams. Some are so big that my mind can't show them completelly. And I see them slowly. Now the top right corner, sometimes the lower left corner, I see them slowly ... slowly. Maybe my window is one of those with no wall. Maybe that's why nobody see it and why nobody see me. I think we are all conquerors of the world while we sleep. After waking up ... well, after waking up to some remained the conquer while others get to real life,get back to the opacity of real life. The world becomes a stranger at every waking. We opened the window and nothing that we see is familiar. We left the house and we don't even know the name of the street we're walking. But it is already loose other words. Ana Reis

Comentários

Mensagens populares deste blogue

A Velha que vivia num sapato (Versão portuguesa (portuguese version))

Era uma vez... (ou podiam ser duas ou três) Uma velha que vivia dentro de um sapato. Mas não era um sapato qualquer! Era uma bota com alguns remendos a descoser. A morada dela era como que encantada e bela. Nas cartas que costumava escrever podia ler-se: Rua Sapato-bota, número quarenta e meio, Uma velha ao vosso serviço sem medo do alheio. Quando a primavera se lembrava de aparecer todos paravam para ver O jardim maravilhoso que aquela bota tinha. Tinha árvores e flores sem fim, E cheiros maravilhosos que se espalhavam por todo o jardim! O portão era pequeno e engraçado e estava um pouco enferrujado. O seu ferro foi envelhecendo com o passar do tempo. E sempre que o abriam era possível saber Quem lá entrava pelo barulho que ele costumava fazer. E o seu telhado era um pouco inclinado. As suas paredes já estavam um pouco gastas do tempo. E a porta estava sempre aberta para quem quisesse lá entrar. E muitos eram os que queriam a velha visitar! No seu...

Palavras Soltas (01/04/2014 Dinâmica de grupo: O Abrigo Subterrâneo)

As palavras soltas de hoje vão falar de memórias. Hoje estive a arrumar o meu sótão, em todos os sentidos, e consegui encontrar as coisas mais maravilhosas por lá perdidas e, algumas, esquecidas. Vou tentar partilhar convosco algumas delas ao longo do tempo, pelo menos as mais relevantes e, de certa forma, engraçadas. A memória de hoje vai para o meu último ano de Licenciatura. Tinha uma disciplina com o nome Dinâmica de Grupos que era bastante interessante por interagíamos muito uns com os outros e tentávamos funcionar como um grupo. Acho que foi um bom trabalho para aprendermos a trabalhar em equipa. Se bem que na prática as coisas não são tal e qual a teoria. Um dos desafios que nos foram lançados ao longo do semestre foi a dinâmica: O Abrigo Subterrâneo. E vou lançar-vos o desafio também. "Imaginem que uma cidade no mundo está sob ameaça de ser bombardeada. Aproxima-se um homem de nós e solicita-nos que tomemos uma decisão imediata. Existe um abrigo subterrâneo que só pode...

Regressos / Returns

  As palavras soltas de hoje falam sobre regressos. Já há muito tempo que não as escrevo. E tanto tempo há que vocês não as leem. Por isso, hoje, resolvi escrevê-las. Estas pequenas palavras. Livres. Soltas. Tal como sempre vos habituei. E regressar traz sempre um sentimento agridoce. Tanto de excitação como de medo. As palavras soltas têm destas coisas. Sempre que escrevo deixo que seja o meu cérebro a comandar as minhas palavras. Ou serão as minhas palavras que controlam o cérebro?! Lidar com os pensamento enquanto escrevo é obrigatório. Não tenho escapatória possível. E, assim, regresso. Regresso ao meu mundo. Aquele mundo onde escrevo e desenho. Alio duas áreas da criatividade que sempre amei. E não me importo de viver aqui. Neste meu mundo de criatividade. Sinto-me abraçada sempre que o faço. Escrever. Desenhar. E regressar. Bem-vindas queridas palavras soltas! Que este seja um regresso para ficar. Bem, mas estas já são outras palavras soltas. Today's words will talk about ret...