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Palavras soltas (19/09/2014 - A voz/ The voice)




As palavras soltas de hoje sentem-se contadoras de histórias. Contadoras de uma história simples e igual a todas as outras histórias que estamos habituados a ouvir. Ou, então, não. E esta história é uma história de um rapaz que conhece uma rapariga mas, ficam desde já a saber, que não se trata de uma história de amor. Onde ficamos exatamente? Ah, já me recordo. Quando estava bem relaxada e perdida nos seus pensamentos sentiu que uma onda de água a cobrira da cabeça aos pés. Abriu os olhos e viu um carro parado um pouco mais à frente. Naquele momento rogou-lhe tantas pragas. Praguejou tudo e mais alguma coisa. A porta do carro abriu-se e um rapaz saiu de lá. E, para seu espanto, era o mesmo rapaz que ela havia, acidentalmente, quase atropelado com a sua bicicleta. Ele aproximou-se dela a correr. "Está tudo bem consigo?" Perguntou ele. E os seus olhos sorriram ao ver que era ela. O seu rosto iluminou-se com as suas feições engraçadas de menina. Mas ela não havia reparado nisso. "Estou bem." Respondeu ela. E ele devorou cada palavra que a sua boca proferira. Sorveu cada letra ao ritmo do movimento dos seus lábios. Nem se apercebeu da chegada do autocarro. Ela tirou o bilhete e disse-lhe "Adeus. Até à próxima!" Ele ainda correu para perguntar-lhe se queria sair à noite com ele mas ela já não o ouviu. Ele falara para dentro a pensar para fora. Queria ter-lhe dito mil e uma palavras bonitas mas não conseguiu proferir nenhuma. Apenas lhe havia perguntado se ela estava bem. E estava. Entrou no carro e seguiu a sua viajem a pensar nela. Sempre que avistava um autocarro olhava para o seu interior para descobrir aquela cara que lhe era tão familiar. Mas, nesse dia, nunca mais a vira ou encontrara. No dia seguinte o sol brilhava no céu. Já não existiam vestígios de nuvens no céu. Vestiu a sua roupa normal para mais um dia de trabalho. Olhou a fotografia que tinha da sua avó consigo ao colo junto à porta e saiu. Nesse dia queria ir a pé para o trabalho. Podia ser que alguém viesse contra ele de bicicleta. Podia ser que a visse numa paragem de autocarro. Mas não a viu. E teve mais um daqueles dias normais e aborrecidos de trabalho. Sempre que olhava pela janela lembrava-se dela. E chegou a dar por si a procurá-la por entre a multidão. Quando foi almoçar sentiu um enorme vazio invadir-lhe o peito. Já não tinha a casa da sua avó para almoçar. Já não tinha a sua companhia sempre tão dedicada. Tinha que ir a um restaurante. Do outro lado da rua havia um café que tinha uns pratos especiais muito bons. Resolveu atravessar e almoçar por ali. Sentou-se e abriu o jornal para ler as notícias do dia. Nada de especial tinha acontecido durante o fim-de-semana. Pediu um cachorro especial. Enquanto almoçava ia observando a correria normal naquela cidade. Carros a passarem de um lado para o outro a toda a velocidade. Pessoas a correr nas passadeiras para conseguirem atravessar a estrada. E não. Nenhuma daquelas caras lhe era familiar. Nenhuma daquelas caras lhe traziam a que ele procurava. Todas tão familiares e ao mesmo tempo desconhecidas. Aquele dia parecia não terminar. Voltou ao escritório onde trabalhava. Voltou a olhar a janela sempre que podia. Não. Não havia sinais daquela rapariga no meio da multidão que se ia atropelando lá em baixo. Nunca mais eram horas de voltar para casa. E poder percorrer novamente aquelas ruas na esperança de, ainda, vê-la. Saiu mesmo à hora. O seu coração já não aguentava conter tamanha ansiedade no seu interior. Virou a esquina e pensou que aquele seria o local ideal para ela vir de bicicleta e bater de frente com ele. Mas aquela esquina não teve nada de especial. Era só mais uma entre muitas outras esquinas. Hoje não podia esquecer-se de ver a caixa de correio. Estava à espera de uns documentos ainda referentes à sua falecida avó. Eram uns documentos urgentes. Não podia mesmo esquecer-se. Chegou à caixa do correio com o número da sua porta e agarrou na chave para a abrir. Não dava jeito nenhum que ainda não tivessem chegado. Mas a caixa estava completamente cheia de publicidade. Não havia sinal nenhum da presença de uma carta no seu interior. Fechou a caixa de correio e voltou-se a praguejar para começar a subir as escadas. Foi aí que sentiu um grande empurrão. "Desculpe. Eu não o tinha visto. Estou mesmo atrasada." Disse uma voz que lhe parecia muito familiar. Olhou na sua direção e reparou que era a rapariga que tinha ansiado encontrar durante todo o seu dia. Bem, mas isto já são outras palavras soltas. Ana Reis

 


Today my words are storytellers. They will tell you a simple story. A story like all the other stories we're used to hear. Or, not. And this story is a story of a boy who meets a girl but you need to know that this is not a love story. Where were we exactly? Oh! Now I remember. When she was very relaxed and lost in her thoughts she felt a surge of water that had covered her from head to toe. She opened her eyes and saw a car that stopped a little ahead. At that moment she begged him so many curses. She cursed everything and anything. The car door opened and a guy came out. And to her amazement, it was the same boy she had accidentally almost hit with her bike. He approached her running "It's everything ok with you?" He asked her. And his eyes smiled when he saw that was her. His face light up with her funny features of little girl. But she hadn't noticed it. "I am fine." She replied. And he devoured every word she uttered with her mouth. He sipped each letter by the rhythm of the movement of her lips. He neither noticed the arrival of the bus. She took the ticket and said, "Goodbye. Until next time!" He even tried to ask her if she wanted to go out that night with him but she hasn't heard. He spoke thinking from the inside to the outside. He wish he had told her a thousand of the most beautiful words in whole world but he couldn't utter any words. He had just asked if she was okay. And she was. He gots into his car and followed the journey thinking about her. Whenever he saw a bus he looked into it to find that familiar face. The face of that girl. But in that day he never had seen or found her. The next day the sun shone in the sky. And there were no traces of clouds in the sky. He wore their normal clothes for a day's work. He looked at the picture he had of his grandmother with him at her lap next to the door and left. That day he wanted to go walking to work. Maybe someone would come against him by bicycle. Or he could see someone at a bus stop. But he didn't see. And had another one of those boring and normal working days. Every time he looked out the window he remembered her. And even caught himself searching for her through the crowd. At lunch time he felt a huge void invading his chest. He no longer had his grandmother's house for lunch. He no longer had his dedicated company. So he had to go to a restaurant. Across the street was a cafe that had some very good special meals. He decided to cross the road and lunch there. He sat down and opened the newspaper to read the news of the day. Nothing special had happened during the week-end. He asked for a special sandwich. While he was having lunch he could see the usual rush of that city. Cars moving from one side to other at full speed. People running on treadmills to get across the road. And no. None of those faces were familiar. None of those faces brought him what he was looking fort. All such familiar but at the same time unknown. That day seemed to have no end. He returned to his office. He looked at the window whenever he could. No.  No signs of that girl in the middle of the crowd. And the hours seeemed not to pass so he can go home again. So he can be able to go through those streets again hoping to see her. The hours seeemed not to pass. His heart couldn't contain anymore such anxiety inside. He turned the corner and thought that that place would be the ideal for a bike accident. But that corner had nothing special. It was only one among many other corners. Today he couldn't forget to see the mailbox. He was waiting for some documents that belonged to his deceased grandmother. And they were urgent documents. He couldn't really forget to check the mailbox. When he arrived at the mailbox with the number of his door he grabbed the key to open it. The documents haven't arrived yet. But the box was completely filled with advertising things. There was no sign of the presence of a letter inside. He closed the mailbox and turned to get the stairs. It was then that he felt a big push. "Sorry. I hadn't seen you. I'm really late." Said a voice that seemed very familiar. He looked in the direction of that familiar voice and noticed that it was the girl who he had longed to find throughout yourhis day. Well, but this is already another kind of words.  Ana Reis

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